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Vera Lúcia de Oliveira (Maccherani)
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Note critiche su

Minha lingua roça o mundo

di Vera Lúcia de Oliveira (Maccherani)

   Editora Patuá, San Paolo, 2018

 

Testi critici di  Carlos Machado, Daisa Rossetto

"Minha lingua roça o mundo"

Carlos Machado

Estilhaços de vida

 


"Alguma poesia",  poesia.net  n.418  ano 17, 13/03/2019 


Vera Lúcia de Oliveira, 08/2018

Estilhaços de vida

Vera Lúcia de Oliveira

A poeta Vera Lúcia de Oliveira (Cândido Mota-SP, 1958) já é conhecida de quem acompanha este boletim há algum tempo. Ela esteve aqui pela última vez em outubro de 2015, na edição n. 341 do poesia.​net, que punha em destaque seus livros O Músculo Amargo do Mundo (Escrituras, 2014) e A Poesia É um Estado de Transe (Portal, 2010). Agora, a autora retorna, graças ao lançamento recente de sua coletânea Minha Língua Roça o Mundo (Patuá, 2018).

 

Nesse novo trabalho, Vera Lúcia de Oliveira mantém traços essenciais de sua poesia, sempre voltada para a vida de figuras brasileiras, especialmente pessoas mais humildes, suas lutas, sofrimentos e pequenas alegrias.

Embora já resida há décadas na Itália, a poeta não perde a referência das gentes e lugares de seu país de origem. Seu livro Minha Língua Roça o Mundo é uma coleção de poemas, quase sempre curtos, nos quais se traçam retratos de gente brasileira sem nome e sem brilho.


•o•

Para este boletim, selecionei seis poemas do livro. Observo que, neste volume, a autora não agrega títulos aos poemas. Procedo então da forma que aqui já se tornou padrão nesses casos: uso como título o primeiro verso do poema, entre colchetes.

 

O primeiro poema de nossa miniantologia é “[No Beiral da Casa]”. Trata-se de um momento lírico, que se destaca entre tantos outros de amargura e até mesmo de tragédia. É o caso do próximo poema, “[Em Dias de Vento e Frio]”.

Em “[Memória é Medo]” e “[Estava na Cozinha]”, o leitor encontra dois exemplos de solidão, desamparo e, ainda, desencontro familiar. Os versos são curtos e ágeis, sem nenhum colorido ou efeito especial. Os textos se apresentam com a mesma secura dos estilhaços de vida que retratam.


•o•

No poema seguinte, “[Quando Vi o Mar pela Primeira Vez]”, vem mais um momento de lirismo e maravilhamento da pessoa, certamente alguém do interior que tem a oportunidade de conhecer a imensidão do mar.

 

No último texto, “[Retirou uma Planta Renitente]”, ocorre uma mudança de narrador. Em todos os outros, a voz é de alguém que participa, ou participou, da cena e fala em primeira pessoa. Agora, quem tem a palavra é um espectador, que descreve a visita de uma mulher ao túmulo de pessoa muito próxima: marido? filho?


•o•

Há um aspecto interessante no livro de Vera Lúcia de Oliveira. Cada poema, considerado isoladamente, não passa de um pedaço de vida, uma cena, uma lembrança. Após a leitura, os estilhaços se juntam na cabeça do leitor formando um amplo painel de pessoas deserdadas, desgarradas e sofridas que teimosamente lutam para seguir em frente.

no beiral da casa
faziam ninhos as andorinhas
dali partiam rasantes
num diz-que-diz-que de bicos
a casa parece que levitava
de pios e ninhos
em atropelo

tem dias que achava
que o telhado ia levantar voo

em dias de vento e frio
a mãe se levantava de noite
abria a cômoda desempacotava panos
toalhas fronhas lençóis e tudo
o que pudesse cobrir um corpo

a geada passava perto
estendia-se sobre os campos
sem coragem de abater
a pirâmide de trapos e tramas
que ela edificava sobre nós

 

memória é medo
que se entreva
entre as teias
do corpo
memória é osso
sem carne
que cobrimos
da melhor forma
possível
para que não
sangre

estava na cozinha
escolhendo feijão
com a alma solta
no vento
ele veio
me rasgou
por dentro
e nunca mais
tive conserto

 

quando vi o mar pela primeira vez
a emoção foi tanta que adoeci
senti-me abraçada por aquela
extensão de água e céu
onde se podia entrar
e até sumir

retirou uma planta renitente
enfiada entre os tijolos
do jazigo
limpou a superfície do pó
jogou a água morta
de um vaso desbeiçado

ali tinha lugar
para dois, falou
olhando distraída
a água encher de novo
o vaso que ajeitou
com as margaridas

Carlos Machado, "Estilhaços de vida", Alguma Poesia, poesia.net n.418, 17/03/2019

http://www.algumapoesia.com.br/poesia4/poesianet418.htm

Daisa Rossetto

"Minha lingua rocha o mundo"

Estão por aí, no mundo, alguns livros que nos encontram e nos levam para lugares que não sabemos localizar no mapa…

 

Esses livros respingam certa nostalgia que nos dias seguintes, ao fechar a última página, ficamos por vasculhar um não sei ao certo o que é, permanece a sensação. É como um sonho que sabemos que tivemos mas não é possível lembrar. A memória foi emprestada para os olhos que chegam – só de leve – onde a língua roçou.

 

Minha língua roça o mundo foi minha leitura numa noite e numa manhã. Eram dias chuvosos, cinzas e silenciosos de janeiro. Sem pressa nem hora, nestas páginas encontrei uma poesia que se esparrama para além dos versos. Está no papel, nas cores e nas fotografias feitas pelas mesmas mãos que fizeram os versos.

 

Minha língua roça o mundo é uma daquelas leituras que fiz e que ficou pairando sobre mim em dias após, nas páginas que revejo marcadas com fitas, nos fragmentos que vou lembrando sem entender. Na palavra que falta e que fica para ser sentida como uma casa antes de mim…

 

 

 

Daisa Rossetto, "Minha lingua roça o mundo"

'Cronicas, Lugares e Café', 13/02/2019

https://www.daisarossetto.com.br/2019/02/13/minha-lingua-roca-o-mundo/

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(by Claudio Maccherani )