Poesia & Poesia
Poesia bilingue - italiano e portoghese brasiliano.
Vera Lúcia de Oliveira (Maccherani)
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Nuno Júdice

Por dentro do fruto a chuva

Antologia poética

 Seleção, organização e prefácio de
Vera Lúcia de Oliveira
(Maccherani)


Escrituras, São Paulo, 2004


14x21 cm, 160 pag, ISBN: 85-7531-123-9
copertina di Vera Andrade


Per l'acquisto del libro:Escrituras Editora e Distribudora de Livros Ltda
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"Corcovado" - Tom Jobim

 


"Por dentro do fruto a chuva" - Nuno Júdice
Vera Lúcia de Oliveira, 2004 

RETRATO

Encosta-se à parede. A brancura
das pernas contra o negro da sombra. O
risco da meia no risco do papel; e
os dedos que firam a pele. Os olhos
fechados no excesso da luz. Entreabre
os braços, deixando que os seios
saltem para o sol. O rigor do vento
abranda nessa imagem.

De «As regras da perspectiva» (1990)

NA LOJA

Sigo o gesto com que experimentas a blusa,
nesse meio de tarde a meio da vida, e roubo-te
o instante entre o despir e o vestir, quando
os teus olhos, presos numa hesitação de espelho,
descobrem que te vejo, e me pedem que
não saia de ao pé de ti, enquanto do lado
de fora as empregadas perguntam por que
demoras tanto tempo, sozinha, para escolher

o que já está escolhido, entre tu e eu.

De «O Estado dos Campos» (2002)


POÉTICA E METAFÍSICA DO POENTE

 Por dentro do fruto a chuva, antologia poética do português Nuno Júdice, voz entre as mais altas e originais da literatura portuguesa contemporânea, dá-nos uma amostra de como o poeta combate a sua silenciosa e quotidiana luta contra o indizível da poesia. Porque para o autor a poesia é o mistério, a revelação do absoluto que ele tenta, a todo custo, plasmar nas formas que a língua lhe pôs à disposição. É o incomensurável que ele procura domesticar na convivência pertinaz de cada momento. (...)

Cada poema não é que um fragmento de um todo muito mais vasto e intricado, pois a sua “essência reside no fragmento de um absoluto / que algum deus levou consigo” (“Metafísica”). Por isso, pela impossibilidade de capturar o esconso desta substância fluida, Nuno Júdice não despreza o recurso ao inconsciente, ao sonho, à bruma, às manhãs de outono e inverno, às atmosferas em que onírico é colhido de forma profusa, impetuosa e barroca e em que os vocábulos se associam de modo aparentemente caótico, arrastando o puro e o impuro da memória. Há uma procura do senso íntimo e visceral de cada instante e de cada elemento, principalmente no seio da natureza, freqüentemente revisitada pelo poeta. (...)

Celebrar o imanente e captar o subjacente secreto, o respirar manso do mundo em mutação, é o seu intento. Daí a freqüência nos versos das atmosferas chuvosas, que impregnam a terra, contaminam o inerte, criam um tempo de passagem e de elo entre o sólido e o líquido, a matéria e o movimento voraz da vida que se perpetua. Essa mesma contaminação leva para dentro do poema as coisas e pessoas concretas da existência e para fora essas mesmas coisas e pessoas transfiguradas, menos contingentes e precárias, mais vivas do que na própria vida. (...)

Supérfluo é ir buscar em Nuno Júdice a luz solar mediterrânea de uma Sophia de Mello Breyner ou de um Eugênio de Andrade. A luz que lambe seus versos é enevoada, luz nórdica difusa, que ilumina em lusco-fusco, sem revelar totalmente, mas sem ofuscar com a sua intensidade. A noite, com sua umidade de ventre e seus rumores indistintos parece revelar mais do que o dia distinto e racional. Até mesmo uma cidade luzente como Lisboa mostra uma faceta inusitada de si, se vista sob a névoa do inverno: “em Lisboa, / no inverno, há quem sofra com a solidão que / desce com a tarde” (“Um inverno em Lisboa”). (...)

O surpreendente neste poeta é que, embora sua poesia pareça debruçada sobre si mesma, sem historicidade e sem ambição de projetar-se ativa e incisivamente na realidade, na verdade para Nuno Júdice a poesia tem função altamente humanizadora, de pesquisa e conhecimento da nossa essência mais íntima, é atividade cognitiva por excelência e dela não prescindimos. (...)

Vera Lúcia de Oliveira

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(by Claudio Maccherani )